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domingo, 14 de agosto de 2011

Juarez


“Eu sei que determinada rua que eu já passei não tornará a ouvir o som dos meus passos.
Tem uma revista que eu guardo há muitos anos, e que nunca mais eu vou abrir.
Cada vez que me despeço de uma pessoa pode ser que essa pessoa esteja me vendo pela última vez.
A morte surda caminha ao meu lado, e eu não sei em que esquina ela vai me beijar.” Raul Seixas



Todos nós sabemos da nossa finitude, que a morte um dia chegará até nós. Mesmo quem acredita em outras vidas ou coisas do tipo, sabe muito bem que esta vida é única.
Quando morre uma pessoa velhinha quase sempre nos conformamos. Ficamos tristes, sim, mas fica sempre aquela sensação de que o tempo fez o seu trabalho. Vamos no velório, choramos, mas os comentários são sempre aqueles do tipo “descansou”, “agora ficou em paz”. Se a pessoa fumava ou bebia muito, se tinha uma doença grave, nos confortamos com a ideia de que talvez a morte tenha sido a melhor solução. Não suportamos o sofrimento, por isso achamos que a pessoa ao morrer se libertou daquilo que a fazia sofrer.
Mas, e quando é um jovem que morre?
Não há consolo possível diante de uma criança ou um jovem morto. Se era doente, se sofria de uma enfermidade terrível...mesmo assim é quase impossível suportar a ideia de que a vida seja abreviada, que acabe tão cedo.
Um jovem que morre assassinado é um absurdo ainda maior. Não cabem justificativas. Nenhuma filosofia explica.

Nosso colega, amigo, aluno Juarez era um garoto de apenas 15 anos!
Acreditava em deus e cantava no coral da igreja. Estudava na C30 da escola Dolores e estava em seu primeiro emprego. O máximo que poderíamos dizer dele é que ficava indignado com as gracinhas e tolices que ouvia de alguns colegas (porque tinha dificuldades de dicção).
Estava em uma lan house, às 11 horas da manhã de uma sexta-feira, possivelmente jogando alguma coisa ou mexendo no msn. Foi morto com vários tiros, pelas costas. Talvez nem tenha tido tempo de ver seus algozes.
Foi ele. Poderia ter sido qualquer um de nós.

Um brigadiano parado numa esquina ali por perto teria impedido o que aconteceu. Mas não havia policial nenhum. Na Restinga não há praticamente policiamento, nem fiscalização de trânsito, nem muitas outras coisas.
Um dia antes estava na escola o prefeito de Porto Alegre. Imagino que neste dia houve polícia, jornalistas, guarda municipal, assessores, puxa-sacos e tudo mais.
Se o governo não garante minimamente a segurança de garotos de quinze anos às onze da manhã e em local público, para que serve um governo?

Não podemos ficar somente expondo nossa dor. Ela é sincera e precisa ser dita, mas isto não basta. Precisamos dar um sentido para além da perda e do sofrimento.
É preciso ir além, em nome do nosso amigo que morreu estupidamente. Em nome também de milhares de jovens de periferia que morrem assim no Brasil todos os anos.
Vamos cobrar dos governos, da polícia, da mídia. Fazer pressão, incomodá-los, exigir que façam aquilo para o qual são pagos. Para que estes absurdos parem de acontecer.

Se ficarmos calados, o Juarez será tratado como apenas mais um, um número a mais nas cifras da violência no Brasil.




[Foto: Juarez Fernando Oliveira Weber]